segunda-feira, 30 de julho de 2007

Amarga escolha


É engraçado como vêm e vão as coisas do coração.
O amor. Parece que não conseguimos viver sem ele,
Mas a confusão, com ele, traz distúrbio à razão.
Amarga escolha: Paz sem desejo, paixão sem reflexão.



Escrito enquanto estava "assistindo" aula de Metodologia Científica e desabafando (por escrito, pra não atrapalhar a aula) sobre as tais coisas do coração com Fátima.

sábado, 28 de julho de 2007

Sobre as palavras humanas e os números exatos.

Amo as letras. Elas falam comigo. Dançam nas páginas num balé interminável. Chamam-me pra dançar, sussurram no meu ouvido. Acho graça nas suas confidências e às vezes acho graça no que elas me contam sobre os outros. Às vezes elas me confrontam e dizem coisas sobre mim, coisas que preferia não ouvir, não pensar, mas é então que as palavras funcionam como centenas de aguilhões perfurando minha alma, querendo chamar minha atenção para o que é ser. Ser nelas.
As palavras são espelho: Mostram-me, sem hesitar, aquilo que sou. Mel e fel, agridem e afagam, fazem-me rir e chorar. Mudam meu jeito de pensar e encarar as coisas as quais antes não percebia, abrem os meus olhos como se estivesse parindo um sentimento novo, emergindo de um mar de escuridão que me puxava pra baixo e que eu vejo puxando tantos ainda. As palavras me ajudam a escapar desse charco de lama e areia movediça, repleta de zumbis repetindo insistente e irritantemente: Sempre foi assim!
As palavras me acordam, excitam. Tiram-me da mesmice, da hipocrisia medíocre. Dão-me coragem: Tudo aquilo que não tenho coragem de falar posso desabafar com as palavras, num embate homérico com a tinta, a caneta e o papel. Não sou tão bom com as palavras, mas elas não tão são exigentes e sempre me chamam para brincar, embalam-me no colo e sempre cantam músicas de ninar. E a guerra que há dentro de mim passa, há um consolo, ainda que momentâneo, mas há.
Sonhei com os números: Corria dentro de um salão repleto de números gigantes. Sentia-me sozinho e angustiado. Queria alguém pra falar comigo e me ouvir, mas os números não falavam. Acho que realmente os números não falam: Eles estão mortos. Tentei sacudir seus ombros para ver se reagiam, estavam inertes, porém. De repente, pela janela, entra um baile de letras acompanhado por uma música orquestral, e a cada vez que uma letra tocava em um número, este era tomado do fôlego da vida. E sorriam! Você já viu um número sorrir? É uma experiência única. Bizarra, porém única. E neste baile com as palavras os números sussurraram três vezes meu nome, contaram a quantidade de flores que preguei em minha lapela, calcularam a aceleração dos meus sonhos e, se não conseguiram expressá-los em metros por segundo, nem descrevê-los pela óptica, pela dinâmica, muito menos pela estática, refrataram meus sentimentos numa acústica infinita, criando ondas partindo de um epicentro formador de círculos concêntricos duma esperança que renova. Dancei com um número, até!!! (Você acredita nisso?). A mágica das palavras possibilitou este milagre, e neste baile os físicos conversavam com os sociólogos, e riam-se. Os antropólogos e os cientistas políticos davam-se às gargalhadas com os biólogos. E as enfermeiras? Estas sempre preocupadas com a nossa saúde falavam pouco, mas olhavam tudo aquilo com um olhar que fala muito. Falavam quase nada, mas dançavam!
O baile estava ótimo, mas já estava terminando! O maestro Marks anuncia a última música: Todo carnaval tem seu fim! A festa acabou, mas os números saíram amigos das palavras. Uma amizade desconfiada, devo ressaltar. Mas será que uma grande amizade não pode começar assim? As palavras se surpreenderam com os números. Mas toda surpresa não faz um bem danado a quem a recebe assim... Prontinha? E eu... Fui embora com as palavras, claro. Mas os números ficaram na memória. Quem sabe se num outro baile desses agente não se encontra?


Uma homenagem às palavras, aos físicos, às enfermeiras, aos meus amigos cientistas sociais e a Gildemarks Santos Silva, professor da cadeira de Introdução à Educação.

Cleonardo

Proibida a entrada de pessoas perfeitas

(Sobre a busca da falsa vitória, a espiritualidade do parecer e a anulação da fragilidade humana).

Quem sempre quer vitória perde a glória de chorar, canta Marcelo Camelo.

Minha alma está profundamente deprimida até a morte, certa vez disse Jesus.

Não exponha suas fragilidades. Isto significa fraqueza, propaga o mundo.

Não exponha suas fragilidades. Isto significa fraqueza, tem dito a igreja.

E tem dito mais: O “abençoado”, este “super-crente-filipenses 4:13” tão apregoado nas igrejas de hoje, não conhece derrotas. “Tudo pode naquele que o fortalece”, ganha carro novo, casa nova, se tinha pendência na justiça, ganha a causa, se tem negócio, ele prospera, se está doente, fica curado (ele tem muita “fé”!). Todo domingo à noite vai fazer compras no supermercado espiritual e se não encontra o que lhe agrada, reclama, e logo depois procura outro de tantos vendilhões que insistem em ocupar o que deveria ser um templo. “O que os homens desejam não é a beleza de Deus. O que eles desejam é manipular o seu poder”, explica Rubem Alves. Quem disse: “Tudo te darei se prostrado me adorares” não foi Deus, foi Satanás. Quem sempre quer esta “vitória”, perde a glória de chorar. Perde a oportunidade de ser curado na enfermidade, e não da enfermidade. Perde a glória de ser lapidado e chegar à maturidade através das crises. Quem esquece de Filipenses 4:12 perde a oportunidade de aprender o segredo de “viver contente em toda e qualquer situação”.
Os mais–que-falsos-vencedores têm um comportamento incólume, uma personalidade inexoravelmente de acordo com os padrões da sociedade (Ah!... Sociedade é esse bicho formado por mais de mil olhos, carregando um espelho no qual você se vê como ele quer que você seja e não como você realmente o é). Cultivam a espiritualidade do “parecer”, a mesma dos lobos tentando ser cordeiros, ou dos sepulcros, podres por dentro, ainda que caiados. Não entendem que ser é o bastante. Quando ora, o super-crente levanta os olhos e agradece por ser mais “espiritual” (Meu Deus! O que fizeram com essa palavra?) do que estes publicanos-sem-unção. Todos os oráculos necessários ao bom curso de sua vida, oráculos estes inalcançáveis aos simples mortais, são fornecidos, a todo tempo, por esse deus para o qual os ultra-santos oram tanto (deus com letra minúscula mesmo! À transformação da poesia – e o que é Deus senão poesia – em manipulação milagreira os profetas chamam de idolatria). Ah sim... E vossa santidade sempre se utiliza deste recurso (o de ser quase que exclusivamente o único porta-voz de Deus, eita!, deus) para não haver criptonita, ou seja, discordância: “deus falou ao meu coração”, dizem eles. Ele ora mais que os outros, vai a todas as vigílias, e até dá esmolas (Querendo livrar-se logo da broca escondida sob os trapos do mendicante e que tritura a sua consciência - A esta broca Deus Pai chamou de Espírito Santo). O inominável, enfim, não sorri, leva tudo a sério. Amarra tudo, até a cara. Carrega o fardo da perfeição, tem sobre suas costas a crença num deus que pesa a mão. Hum... Deve ser por isso que falam sempre rangendo os dentes... Além disso, os infalíveis são também conhecidos como os caçadores de brechas. Eu não sei onde eles foram buscar essa “diabose”. Olha a brecha, meu irmão! Cuidado com a brecha! Dizem eles. Vá se converter! Gritam. Vigie irmão! Ameaçam. Dizem: o diabo pode adquirir direito legal sobre a sua vida... Sobre a minha um escambal! Leiam o Novo Testamento, esqueçam um pouco Rebeca Brown!
E Jesus!? (Eu fico pensando: Será que esse povo lê a bíblia?). Parece que o Mestre escolheu comportar-se bem diferente dos que arvoram ter o monopólio de suas idéias. Vejamos: Ao invés de entrar em Jerusalém numa carruagem imperial, atraindo a atenção da mídia da época, que por si só já o procurava haja vista os sinais por ele realizados; preferiu um jumentinho. Um jumentinho! É quase cômico! Você já viu alguém andar num jumentinho? As pernas ficam quase se arrastando no chão, não há o menor sinal de pompa ao montar neste animal. Fico imaginando os caudilhos de nossas igrejas descendo do pedestal e adentrando ao culto no lombo de um eqüino. Ele dizia com isso: Meu reino não é desse mundo, não penso como vocês pensam, não estou em busca dos holofotes, da aprovação do bicho de mil olhos. Meu reino é de justiça, paz e alegria no Espírito Santo (a broca, que também tem o papel de colo oficial do reino do cavaleiro do jumentinho). Bendito é o que vem em nome do Senhor! Hosana nas alturas!
Jesus nunca valorizou uma espiritualidade que anulasse a fragilidade humana. O mestre também demonstrava fragilidade. Espera aí!...Jesus demonstrava fragilidade? Vejamos: Esclarecendo a citação do início do texto, quando estava no Jardim das Oliveiras, pronto para ser preso e torturado por seus algozes, o mestre da sensibilidade (tomo emprestado o título criado por Augusto Cury) não esconde a sua angústia de seus discípulos mais chegados. Os super-crentes, ou os líderes infalíveis, nunca demonstrariam o seu medo ou insegurança, isto seria a morte. Mas Jesus, contrariando a teologia do parecer, mostra quem é sem se esconder atrás das espessas cortinas de uma pretensa infalibilidade papal. “Minha alma está profundamente deprimida até a morte”, ele disse. O Rei dos Reis, o Senhor dos Senhores, aquele que tudo criou, o que controla os ventos, anda por sobre o mar, cura os enfermos, pisa a cabeça da serpente... Deprimido, e até a morte? Pior!...Dizendo isso aos seus liderados! Jesus estava querendo dizer que não precisamos mostrar, ou tentar mostrar aquilo que não somos. A fragilidade pulsa em nossas veias. Pulsou na veia dEle. Não sejamos hipócritas: Como podemos criar uma espiritualidade que anula nossa pequenez, tentando nos elevar a um status de semi-deuses que não hesitam, não tem desejos, não falham, não desistem, não perdem, não duvidam, nem questionam? Eu prefiro seguir o Mestre da Simplicidade que exulta na minha fragilidade, celebrando comigo minha contradição de querer ser, por amor a Ele, aquilo que só serei quando diante Dele. Se levamos Deus a sério deveríamos nos comportar como crianças, que não se levam tão a sério, preferem um brinquedo a uma nota de R$ 100,00 (não estão preocupados com o amanhã, sabem que seus pais nunca o abandonarão), nem fingem ser o que não são. Como crianças, deveríamos nos juntar para brincar de pintar, e a trindade brincaria conosco. Eles trariam a faixa e a tinta, de dedo. Lambuzaríamos-nos prazerosamente jogando tinta uns nos outros. Cada um poderia pintar aquilo que quisesse. Eles não costumam reprimir nossas iniciativas. Depois, todos juntos, nos reuniríamos para pregar a faixa na frente de nossas igrejas. O Filho pede um calço. Pronto, Ele diz, ficou linda! Quando vocês brincam as coisas saem assim!... E do outro lado todo mundo que passa pode ver o que está escrito na faixa: Proibida a entrada de pessoas perfeitas.
Cleonardo