segunda-feira, 28 de abril de 2008

Esperança nos olhos

Não tenho paciência para o atendimento ao público. Trabalhar com vendas nunca foi prazeroso pra mim (nem um pouco!). Falta-me complacência para lidar com os egos inflados dos clientes. Mas, às vezes, temos gratas surpresas. Hoje, ao atender uma senhora e encontrar o livro que ela procurava, ouvi algo que me enterneceu: - Você tem os olhos lindos! (Até aí tudo bem, até que já me acostumei com este tipo de abordagem). Mas, em seguida, ela disse: - Deve ser muito bom ter a esperança nos olhos...

Fui pra casa sorrindo...

domingo, 27 de abril de 2008

Tu estás, Tu és

Tive, durante um bom tempo, minha mente paralisada para perceber a espiritualidade fora dos arraiais evangélicos. A igreja tenta invocar para si o monopólio da espiritualidade, a exclusividade do caminho até Deus. Coitados! Como limitar o infinito? Como conter um rio que insiste, de todas as formas, em correr para o mar?
Que as represas eclesiásticas sejam destruidas! Que as vozes dos Vinicius, das Clarices, dos Paulos Freires rachem a pretensa ortodoxia dos pretensos baluartes da fé.

Tu estás lá
E tu estás em todos os lugares
E ouço a tua voz na música do mundo E sinto a tua mão na plástica das coisas
Tu és o ponto de partida
Tu és o caminho
E és o fim do caminho
És o cardo que fere os pés
E a grama macia que os repousa
E a grande tempestade de vento E o ar parado que sereniza.
És o pranto dos olhos E o riso da boca
És o sofrimento do mundo
Numa promessa de eterna felicidade
És Deus
Deus que vê todas as coisas e a todas dá remédio
E que é o único perdão:
Amém.

Trecho de "Transfiguração da Montanha", Vinicius de Morais

sábado, 26 de abril de 2008

Se é pra falar de amor...

Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio de escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor
******Carlos Drummond de Andrade

Na vida a gente ama vinte vezes:
Uma por inexperiência,
Dezenove por castigo.
******Antonio Maria

Todo aquele que sabe
separar o amor da paixão
Tem o segredo da vida e da morte
no seu coração
******Paulinho da Viola

Posso lhe garantir: o amor é pura loucura
Merece, como os loucos em geral,
o chicote e a solitária.
******William Shakespeare

porque o amor é forte como a morte,
e duro como a sepultura é o ciúme.
******Cânticos de Salomão

Eu gosto é do estrago
******Rodrigo Amarante

E daí? Eu quero é amar!!!
******Cleonardo

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças

tem coisas que ficam gravadas em nós de tal forma que passam a fazer parte de nossa composição
já tentei esquecer de coisas cujas lembranças me machucam
já tentei colocar pra debaixo do tapete o incômodo dos erros de outrora
mas não adianta
sou o que fui
faço porque fiz
sou o que estas minhas decisões me fizeram ser
sou porque fui
estou porque vim
expurgar estas lembranças seria criar um outro que já não seria mais eu
elas são parasitas de mim, parasita delas sou também
dia desses sonhei tão real que acordei achando que havia voltado algum tempo atrás
senti-me horrível
porque eu iria tomar banho, trocar de roupa e ir pra um lugar que detestei tanto
iria encontrar com pessoas que me ojerizam tanto
à noite estaria com alguém que não combina comigo nem mais um tanto(nem mais um tatinho que seja)
quando a ficha caiu
lembrei que demorei, mas cheguei
cheguei aqui. não onde voces esperavam que eu chegasse
mas no lugar do meu sorriso
no lugar onde minha alma descansa
que alívio ao perceber que o tempo não havia retrocedido
sorri!
o sorriso hoje sai mais fácil
vem mais rápido
as lágrimas também
são de alegria
de tristeza
de paixão
não quero mais apagar nada
essas lembranças me fazem saber de onde vim
e pra onde não quero mais voltar

Perdoa

Deus, por onde você foi?
Cansei de procurar.
Não posso mais ficar
com o pouco que sobrou,
carrego o seu amor
até não conseguir,
mas hoje eu me senti
dobrando devagar,
tentei chorar por seu perdão
mas não ouvi sinal,
será que isso é normal?
Deus, proteja o filho teu.
Não deixa o mal ganhar.
Por onde se escondeu
enquanto o céu caiu?
e a chave não abriu
e a estrada se acabou
e a ponte não passou
pra lá desse lugar.
Eu vou tentar
por mais um dia.
Manda essa cavalaria
que hoje a fé me abandonou...

Marcelo Camelo

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Meu Deus, me dê a coragem



Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. Me dê a coragem de considerar esse vazio como uma plenitude. Faça com que eu seja a Tua amante humilde, entrelaçada a Ti em êxtase. Faça com que eu possa falar com este vazio tremendo e receber como resposta o amor materno que nutre e embala. Faça com que eu tenha a coragem de Te amar, sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo. Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo. Receba em teus braços meu pecado de pensar.
Clarice Lispector

27 motivos pra gostar dela.

1. O sorriso. Ou melhor, a gargalhada. Incomparável!
2. Ninguém corre pra me abraçar e se pendurar em mim quando me vê!
3. O sobrenome dela. Meu fetiche.
4. Ela diz que tem seus “pudores”, mas é mentira.
5. Ela adora Chico e Los Hermanos. O primeiro, mais do que eu.
6. O que foi? Hum!? Hum!? Hum!?
7. Ela não para de cantar um minuto.
8. Ela bagunça bem mais do que consigo nos meus dias mais inspirados. Na verdade, ela é maluquinha!
9. Ela é maluquinha!
10. Quando criamos um mundo paralelo e esquecemos o resto. Eu pensava que só os casais dos filmes ignoravam tudo (e todos) ao redor. Sempre quis fazer isso!!!
11. O silêncio entre nós.
12. O cheiro do beijo.
13. Os verbos de nós dois.
14. O alvoroço em meu coração.
15. O que sou quando estou com ela.
16. O que ela é quando está comigo.
17. O Fogo.
18. A paixão.
19. A amizade.
20. O Fogo.
21. Os momentos no reino do laguinho encantado.
22. Enfim alguém pra falar de durkheim, marx, weber, relativismo, estruturalismo, interacionismo simbólico,etc.
23. Se eu gosto de Vinícius, ela gosta. Se eu canto Nação, ela grita. Se eu toco, ela canta. Se ela dança, eu danço.
24. Por causa da trilha sonora de nós dois.
25. Ela diz o que tem vontade. Faz o que ‘dá na telha’.
26. Ela
27. O “fetiche” dela com o número 27. Pena que eu já vou fazer 28.

O perigo do meio do caminho

Meu círculo de amizades está mudando. Isto nunca aconteceu com você, leitor? Você nunca jurou amizade eterna aos seus amigos e, depois de alguns anos, chegou à conclusão que não poderia mais chamá-los assim? Porque não havia mais afinidades, porque a vida os levou para outro caminho, porque os afazeres do cotidiano separaram vocês, enfim, porque – é difícil aceitar, mas é verdade – nem tudo é pra sempre. Estou no meio do caminho entre amizades antigas, distanciando-se pela falta de contato agravada pela desconstrução das afinidades, e novas amizades cheias de afinidades, porém, ainda, sem intimidade e profundidade. Este caminho do meio é perigoso, leitor. O risco de não ter mais a possibilidade de voltar para os caminhos de outrora somado ao risco dos novos caminhos não darem em lugar nenhum é desesperador. O caminho do meio é desprovido de segurança, cumplicidade. É um caminho vasto, sem ser profundo. Semelhante ao mar quando seca e podemos andar coma água nos tornozelos por quilômetros – você junto ao mar sem poder mergulhar. Drummond encontrou uma pedra no meio do caminho. Espero não tropeçar nela. Há uma intersecção neste caminho? Tenho procurado por ela. Se há, leitor, diga-me! E ajude-me a encontrá-la, a fugir e deixar lá atrás, bem pra trás, o maior de todos os medos, a grande patologia da modernidade: sentir-se só entre muitos.

sábado, 12 de abril de 2008

Bom Conselho


Eu semeio o vento na minha cidade... Vou pra rua e bebo a tempestade.
(Bom conselho - Chico Buarque)
*********************************************************
Sim... Às vezes nos é necessário um pouco de insensatez, um quê de irresponsabilidade, uma pitada de "carpe diem", um drink de "num tô nem aí". Só um pouquinho de "que se exploda", uma dose de "esquece e vem", relembrar que "eu num tô fazendo nada, você também". É indispensável a consciência do tempus fugit, do "comamos e bebamos que amanhã morreremos", esquecer a sisudez, mandar às favas a altivez, chorar, dançar, brincar, enlouquecer de vez. Agir duas vezes antes de pensar, acordar atrasado, faltar aula, falar palavrão, dizer besteira, comer hamburguer e batata frita, estudar na véspera da prova, passar o dia dormindo, tirar catota do nariz, bagunçar no ônibus, contar piada sem graça, pegar o violão e tocar mamonas assassinas quando tá todo mundo esperando uma de Chico, dançar descendo até o chão na concha acústica da ufpe, improvisar um cover dos beatles na frente do quintal do lima(bar), colocar o "créu" pra tocar na festa dos intelectuais, fazer strip no show de academia da berlinda, transgredir, surpreender, ser do contra, metamorfose ambulante, social democrata entre os comunistas, socialista entre os liberais, sóbrio entre os loucos, maluco entre os sérios, rir no luto, chorar de emoção, provocar arrogantes, cético entre os crentes, crente entre os ateus, discutir, reconciliar, cantar(alto), sair sem destino, sonhar, realizar, planejar, fazer, escrever pra você ler, enfim, fazer de tudo e de todos os modos pra não fingir, mas viver...

É verdade

Realizar sonhos. Este privilégio parece a nós, tantas vezes, exclusividade dos mocinhos e mocinhas dos filmes de hollywood. Certas coisas parecem acontecer só com os outros. Passamos muito tempo tendo a impressão de que certas bem-aventuranças insistem em pousar sobre a cabeça de tantos, menos nas nossas. Mas... E quando acontece conosco? Quando algo que você desejava enormemente, incessantemente, chega até você? A lei da "repelência-às-coisas-boas" é quebrada e demora um bom tempo pra "cair a ficha". Pois é, leitor! Assim estou, demorando para acreditar. Hoje vou à uma festa pra comemorar esta conquista... Quem sabe lá possa, finalmente, acreditar que realmente aconteceu.

Escrito uma semana após a aprovação no PET (Programa de Educação Tutorial) de Ciências Sociais - UFPE

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Tributo a um grande homem


Por Ricardo Gondim
**************************
Há quarenta anos tombava um dos personagens mais importantes da história. Uma bala assassina tirou Dr. Martin Luther King Junior deste mundo, com 39 anos de idade. Gente de sua envergadura, contudo, persistem; sua trajetória continua a inspirar mulheres e homens por todos os lados.
Plutarco, o hagiógrafo de Júlio César, conta que numa determinada campanha militar, entrou na barraca onde repousava o então general, que se tornaria no futuro o maior imperador de Roma. Plutarco surpreendeu Júlio César com uma biografia de Alexandre, o Grande. Intrigado por notar lágrimas rolando pela face de César, Plutarco perguntou a razão daquele pranto. Imaginou, talvez, que lamentasse a morte prematura do imperador da Macedônia - Alexandre morrera moço, 33 anos.
César respondeu: “Choro não por ele, mas por mim; com a minha idade Alexandre já havia conquistado o mundo e eu nada fiz ainda”. Hoje, no aniversário da morte do Dr. King, contei os meus anos; já vivi 15 anos a mais do que o herói negro e não sou digno de engraxar os seus sapatos.
Dr. King não temeu expor-se ao ódio dos abjetos; nunca se curvou perante estruturas preconceituosas que se alimentam dos esgotos da discriminação; jamais gaguejou enquanto pregava os valores mais nobres do Reino de Deus; não se limitou a defender orgânica ou corporativamente os afro-descendentes estadunidenses.
Prêmio Nobel da Paz, o Diamante Negro do século XX morreu abraçado à justiça; encarnando a beatitude do Sermão da Montanha: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça porque serão fartos”.
Compungido, reverencio a vida de Martin Luther King Junior. Ouço os sinos e sei que dobram não só por ele, mas por mim, por nós.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

"Deixem-me voar..."

Por Rubem Alves
*********************
DONA CLARA ERA uma velhinha de 95 anos, lá em Minas. Vivia uma religiosidade mansa, sem culpas ou medos. Na cama, cega, a filha lhe lia a Bíblia. De repente ela fez um gesto, interrompendo a leitura. O que ela tinha a dizer era infinitamente mais importante. "Minha filha, sei que minha hora está chegando... Mas que pena! A vida é tão boa..."Eram 6h. Minha filha me acordou. Ela tinha três anos. Fez-me então a pergunta que eu nunca imaginara: "Papai, quando você morrer você vai sentir saudades?" Emudeci. Não sabia o que dizer. Ela entendeu e veio em meu socorro: "Não chore que eu vou te abraçar..." Ela, menina de três anos, sabia que a morte é onde mora a saudade, porque lá a gente fica longe dessa terra tão boa...Eu, por enquanto, não quero morrer. Já tive medo de morrer. Hoje não tenho mais. O que sinto é uma enorme tristeza.Mas tenho muito medo DO morrer. O morrer pode vir acompanhado de dores, humilhações, aparelhos e tubos enfiados no meu corpo contra a minha vontade -sem que eu nada possa fazer porque já não sou mais dono de mim mesmo-, solidão -ninguém tem coragem ou palavras para, de mãos dadas comigo, falar sobre a minha morte-, medo de que a passagem seja demorada.A morte deveria ser como os últimos compassos de uma sonata: belos e tristes, até que venha o silêncio. Camus dia que o suicida prepara seu suicídio como uma obra de arte. Seria possível planejar a própria morte, sem suicídio, como uma obra de arte? Mas quem, nos hospitais, se preocupa com a beleza?Zorba morreu olhando para as montanhas. Uma amiga me disse que quer morrer olhando para o mar. Montanhas e mar: haverá metáforas mais belas para o Grande Mistério?Mas a medicina não entende.Um amigo contou-me dos últimos dias do seu pai, já bem velho. As dores eram terríveis. Dirigiu-se, então, ao médico: "O senhor não poderia aumentar a dose dos analgésicos para que meu pai não sofra?" O médico o olhou com olhar severo e lhe disse: "O senhor está sugerindo que eu pratique a eutanásia?" Impecável o médico, na sua severidade ética e religiosa. Enquanto sua consciência permanecia calma, o velhinho estava mergulhado num abismo de dor.Um outro velhinho querido, 92 anos, cego, surdo, todos os esfíncteres sem controle, numa cama, em meio aos fedores de fezes e urina de repente o acontecimento desejado, libertador: seu coração parou. Ah, com certeza fora o seu anjo da guarda que assim punha um fim à sua miséria! Aquela parada cardíaca era o último acorde da sonata alegre que fora a sua vida! Mas o médico, movido pelos automatismos éticos costumeiros, apressou-se a cumprir o seu dever: debruçou-se sobre o velhinho morto e o fez viver de novo.Dir-me-ão que é dever dos médicos fazer todo o possível para que a vida continue. Mas o que é vida? Mais precisamente: o que é vida de um ser humano? Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. Morta a chance de sentir alegria ou gozar a beleza o corpo se transforma numa casca de cigarra vazia.Muitos dos "recursos heróicos" para manter vivo um paciente são, no meu ponto de vista, uma violência ao princípio da "reverência pela vida". Porque, se os médicos dessem ouvidos ao pedido que a vida está fazendo, a ouviriam dizer: "Sou um pássaro engaiolado. Abram a porta! Deixem-me voar livre pelos ares!"

terça-feira, 1 de abril de 2008

Do silêncio entre nós.

Li, e agora não lembro onde foi, que verdadeiros amigos não precisam procurar ansiosamente por algum assunto quando ele acaba durante a conversa. Amigos sabem aproveitar o silêncio entre eles. Fugimos desesperadamente do silêncio durante uma interação. Fugimos porque temos medo de parecermos desinteressantes, porque não conseguimos olhar nos olhos uns dos outros sem constrangimento. Não aprendemos a contemplar a presença do outro sem precisar inventar o velho “algo pra fazer”. A era das informações trocadas em milhares de bytes por segundo, onde a pressa se transformou em indicador de prestígio e o entretenimento sobrepõe o sentimento, produziu pessoas que não conseguem compartilhar a presença de quem se ama - Somente a presença, e nada mais. Dia desses ela olhou pra mim e disse: - Este silêncio é muito bom! Eu sorri, apenas. Não falei mais nada...

O cheiro do beijo

Eu gosto é do cheiro que sua boca tem. Não estou falando do creme dental, muito menos do aroma que fica após o halls ou o freegells. Definitivamente não é isso. É quando a sombra de todos estes artifícios vai embora. É quando ela se aproxima, expira na minha inspiração, despeja seu fôlego e recebe o meu. É quando o beijo acaba e ela precisa respirar fundo, e eu também, enquanto o cheiro que produzimos invade nossas narinas com intensidade máxima.