sexta-feira, 13 de junho de 2008

Rogo-vos

Amigos podem mudar o curso de nossas vidas. Tolstói poderia dizê-lo com todas as forças. Após decidir se retirar de cena, desistir da literatura, e viver recluso em uma de suas propriedades, ele recebe uma carta de um grande amigo, Turgueniêv. Não era uma carta qualquer, Turgueniêv estava à beira da morte e suas letras continham um último pedido: Tolstói, meu amigo, volte para a literatura! Não há como se certificar se foi por causa desta carta que Tolstói voltou a escrever, pode-se dizer, no entanto, que, após ela, “A morte de Ivan Ilitich”, considerada pelos críticos uma das maiores novelas da história, surgiu para agraciar leitores no mundo inteiro. Dentre eles, eu. Só pude agradecer a Turgueniêv por esta carta, a Tolstói por este livro e aos meus amigos, sim, àqueles que presenciaram as alterações no curso de minha vida, influenciaram, foram influenciados, trouxeram esperanças, levaram conselhos e os trouxeram de volta, chegaram com ouvidos de compreensão, palavras de admoestação, choraram com as minhas conquistas, sorriram sorrisos de comunhão, preocuparam-se com minhas derrotas, regozijaram-se com as voltas por cima, amaram, foram amados, abraçaram, foram abraçados, quiseram, foram queridos, e, mesmo indo embora, deixaram um pouco de si, por terem feito de mim um outro-eu superior ao 'eu' que eu seria sem eles. Agora, já não sou mais eu. Sou eu-com-um-pouco-deles. Por favor, meus amigos, nunca deixem a literatura de vocês, seja ela qual for. Sei que vocês sabem quais as vossas literaturas: Não as deixem. Peço com a mesma intensidade de Turgueniêv. Peço, ainda, meus amigos: Não me deixem. Ainda que muitas vezes tenham vontade de fazê-lo. Como sou um outro após conhecê-los, tornei-me dependente de vós, parasita do que sou ao estar convosco. Como numa hemodiálise, renovo meu sangue repleto de toxinas de tristeza ao compartilhar nossos projetos de um futuro que cada vez mais se encurta e se torna realidade. Como um pretenso grande sábio tentarei gravar nas tábuas de vossos corações esta máxima: Nunca deixem seus propósitos e, ao chegarem lá, roguem para que seus amigos não tenham ficado pra trás.

2 comentários:

Tales Messias disse...

muito bom. meu amigo. digo o mesmo a vc após ler seu texto: nunca deixe sua literatura, sua escrita. abraços.tales

Wellington disse...

CG,

Quem de nós consegue ficar insensível a influência do outro, seja ela boa ou má, especialmente quando se trata de um amigo?
O que somos hoje, foi contruído, de uma forma ou de outra, pelas influências dos nossos companheiros de jornada. Vou plagear descaradamente Turgueniêv: Não abandone sua literatura! Eu a aprecio bastante, pois ela gera inquietação, reflexão, renovação e emoção. Você tá ficando bom nisso!!! Está apurando um olhar radiográfico lançado sobre as almas(a sua principalmente) e sobre o obvio coletivo que nos faz pasmar. Ao final do seus textos tenho sempre duas frases na mente: Uma delas é "é verdade!" e a outra é "Como eu não consegui ver isso antes!". Você tem um grande talento!