domingo, 31 de agosto de 2008

Que saudade...


Amados ou odiados.
Sempre controversos.
A eles, ninguém é indiferente.
Deve ser por isso que eu gosto tanto.


Los Hermanos

A melhor banda brasileira de todos os tempos

O Casamento Dos Pequenos Burgueses

Ele faz o noivo correto
E ela faz que quase desmaia
Vão viver sob o mesmo teto
Até que a casa caia
Até que a casa caia

Ele é o empregado discreto
Ela engoma o seu colarinho
Vão viver sob o mesmo teto
Até explodir o ninho
Até explodir o ninho

Ele faz o macho irrequito
E ela faz crianças de monte
Vão viver sob o mesmo teto
Até secar a fonte
Até secar a fonte

Ele é o funcionário completo
E ela aprende a fazer suspiros
Vão viver sob o mesmo teto
Até trocarem tiros
Até trocarem tiros

Ele tem um caso secreto
Ela diz que não sai dos trilhos
Vão viver sob o mesmo teto
Até casarem os filhos
Até casarem os filhos

Ele fala de cianureto
E ela sonha com formicida
Vão viver sob o mesmo teto
Até que alguém decida
Até que alguém decida

Ele tem um velho projeto
Ela tem um monte de estrias
Vão viver sob o mesmo teto
Até o fim dos dias
Até o fim dos dias

Ele às vezes cede um afeto
Ela só se despe no escuro
Vão viver sob o mesmo teto
Até um breve futuro
Até um breve futuro

Ela esquenta a papa do neto
E ele quase que fez fortuna
Vão viver sob o mesmo teto
Até que a morte os una
Até que a morte os una

Chico Buarque

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Livre de amarras

Eu gosto dele sem ela. Porque ela o sufoca e o transforma em outro.
Mas é um outro chato, metamorfoseado num passarinho preso numa gaiola.
Não vá, leitor, dizer-me que isto é amor.
Amor não afoga o outro num mar de cobranças paranóicas.
Há, nele, a necessidade de construir uma segunda personalidade quando do lado dela, a fim de manter a insegurança que dela emerge controlada, por um momento que seja.
Ao menor sinal da ausência dela, ele volta a ter aquele magnetismo que atrai todos os seus amigos, e os mais chegados, e os irmãos.
E é aí que eu mais gosto dele.
Sem ela.
Livre de amarras.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

My blueberry nights

Têm certas noites que a gente não quer que acabem. Não que elas tenham sido tão excêntricas ou grandiosas assim. É que basta um filme nem tão bom assim, comendo um bolo não tão bom assim, com uma coca-cola não tão gelada assim, numa noite de domingo não tão diferente assim, contanto que ela esteja no meu roteiro desde o primeiro take, pra todo o resto ser coadjuvante e a presença dela ser protagonista.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Amarum vulnerabilisaste est

Amar é vulnerabilizar-se.
Entregar-se à outrem é dar a chave do seu destino. Controlar a nau de nossas vidas é imprescindível, amar, porém, pressupõe a perda da autonomia, pois o que há no mais recôndito de nossa alma passa a ser lido, sem necessidade de tradução, pela alma do outro.
De posse desta leitura, desta tradução, pode o outro conduzir-nos à perdição, à danação. Sim, pode, já que os portões de nossa fortaleza foram abertas e nossa cidade-alma encontra-se sujeita à pilhagem.
Então, não diga que ama. Nunca. Muito menos que ama pra sempre. Porque amar, já o disse, é armadilha. E pra sempre... Pra sempre não existe. Aos que dizem se amar pra sempre, basta submeter o que chamam amor à uma análise micróscopica e poder-se-á ver companheirismo, amizade, cumplicidade, comunhão. Estes sim, sentimentos nobres e perenes, mas o amor que os gregos chamam de eros - não o phileos, o amor fraternal, nem o ágape, o amor desinteressado que tem no divino sua fonte inesgotável - acaba, e nunca de repente, o que é infinitamente pior, pois acompanhar a areia caindo, devagar, no inevitável da ampulheta é anunciar a morte daquilo que definha sem o cheiro do podre, ainda.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

A metamorfose e o meu enjôo

Gregor virou um inseto e eu passei a ter enjôo ao ler nos ônibus. Nunca tive isso, mas depois de ler Kafka no Camaragibe-Príncipe isto começou a acontecer. Vai entender?
A dor de sentir Kafka tornar-se um inseto e gradativamente deixar de ser filho e irmão para ser, somente, um inseto é nauseabunda, como nauseabunda é a dor de ser inseto para tantos neste individualismo fundamentalista no qual vivemos: Colegas passam a ser concorrentes. No trânsito, preciso chegar primeiro, ninguém pode passar na minha frente. No ônibus preciso entrar primeiro, ninguém pode sentar na minha frente. O estranho pode ser um assassino e a imininência da violência do outro torna tudo competição instintiva pela vida, transforma todos em insetos horripilantes, torna o cotidiano uma sociabilidade do nojo.
Deve ser por causa disso que enjoei.
Argh!

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Trocando em miúdos

Eu bato o portão sem fazer alarde
Eu levo a carteira de identidade
Uma saideira, muita saudade
E a leve impressão de que já vou tarde.
Chico Buarque (Trocando em Miúdos)

Mas era justamente o fraco que devia saber ser forte
e partir quando o forte fosse fraco demais
para poder ofender o fraco.
Milan Kundera (A insustentável leveza do ser)


Eram diferentes demais. Eduardo e Mônica só existem na música de Renato Russo mesmo.
Sim, ele sabia disso, mas estava sozinho e solidão é coisa com a qual ele não sabia conviver.
Bem, ela tava sozinha, ele também, por que não tentar?
Uma vez dentro, percebeu que o mundo dela era tão distante do seu que sentia estar falando tcheco enquanto ela entendia em húngaro, respondia em mandarim e gravava as coisas em russo.
Minha gente! Este negócio que os opostos se atraem é conversa! Não acreditem nisso, pelo amor de Deus! Era o seu mais novo conselho aos amigos.
Não o condenem. Ele fez força para manter o imantível. Sentia-se como um malabarista que via seus pratos, antes bem equilibrados, caindo um a um sem mais ter braços para aparar sua queda. A sensação era sufocante. Queria sair dali desesperadamente mas não conseguia fazê-lo. Sim leitor, ele era covarde, fraco. Desde o primeiro momento sabia que iria dar nisso. Mas atire a primeira pedra quem nunca errou, amou errado, ou amou demais porque tem muito amor guardado; e amor guardado apodrece se não encontrar um coração-destino.
Quando saiu de lá sentiu alívio e cantou, mesmo com o peito dilacerado, zerado de amor, mesmo sem as sobras de tudo, cantou, mesmo sem marcas de amor nos lençóis, cantou, mesmo sem ela ter levado seu Neruda, cantou, trocando em miúdos, cantou.

domingo, 3 de agosto de 2008

29

Por Renato Russo

Perdi vinte em vinte e nove amizades
Por conta de uma pedra em minhas mãos
Embriaguei morrendo vinte e nove vezes
Estou aprendendo a viver sem você
Já que você não me quer mais
passei vinte e nove meses num navio
E vinte e nove dias na prisão
E aos vinte e nove com o retorno de saturno
Decidi começar a viver
Quando você deixou de me amar
Aprendi a perdoar e a pedir perdão
E vinte e nove anjos me saudaram
E tive vinte e nove amigos outra vez