Por esses dias lembrei que, quando criança, o lugar onde mais brincava era uma escola. Minha vó tinha um colégio, bem pertinho de minha casa, onde minha mãe era secretária. Sendo assim vivia por lá e o meu passatempo mais corriqueiro era brincar nas salas de aula com o giz e os quadros: Já se plantava dentro de mim uma vocação, da qual tentei, numa época, fugir, mas pra qual voltei, ainda a tempo. Lembrei, mais, que minha aventura principal era subir no telhado dessa escola. O telhado era grande e podia-se chegar até o de um vizinho, sobre sua garagem, e se aproximar do quintal de outro, onde havia árvores frondosas habitados por macacos sagüis. Aquilo tinha um sentido de liberdade enorme pra mim, ao fazer algo que não faria em casa sob a supervisão dos meus pais (Aliás, a casa de minha vó era o local onde fazia estas coisas como assar o queijo coalho espetado num garfo à beira do fogão, sair de casa sem ter que dizer pra onde e jogar bola no campinho da frente sem ter hora pra voltar). No telhado eu sonhava acordado, a adrenalina da aventura me fazia sentir um desbravador de territórios inalcançados e inimagináveis: Era o meu “Fantástico mundo de Bobby”, minha “Nárnia”. Lá no telhado, eu, mesmo criança, pensava na vida. Sentia-me capaz, cheio de vida pela frente e cheio de projetos a serem realizados. Lá eu era muito mais. Podia tudo, enfrentava tudo, não temia nada. No telhado eu era herói e salvava a mocinha. Eu não tinha receio da vida e das suas intempéries. No telhado as pessoas não me machucavam, nem eu a elas. Lá, no telhado, o amanhã não batia à porta com a incerteza debaixo do braço, porque no telhado eu era amigo das certezas. No telhado não havia a dor e a decepção, porque lá os problemas se resolviam e eu não fugia deles, aliás, eles eram muito pequenos, pois lá de cima eu enxergava o mundo, e os problemas, de igual pra igual. No telhado eu me preocupava com ser e não com ter, em amar e não em ser amado, em sorrir, e não em discutir, em brincar, e não em me preocupar. Preocupar? Não havia este verbete no telhado. Lá só havia um céu mais azul, um sentimento de colher o dia e viajar no tempo seguro nas asas da contemplação do belo, do simples, do que realmente importa. Estou distante do telhado há muito tempo. Deve ser por isso que quase perdi os sonhos que lá sonhava, e a realidade pintou-se de dureza e crueldade, parecendo ser um monstro maior do que realmente o é. Estou precisando do telhado urgentemente pra renovar meu estoque de esperança e pra entender que a vida, daqui de baixo também nos sorri e acolhe, nos abraça e nos envolve através dos braços dos que nos têm como preciosidade incomercializável, insubstituível, imexível, imutável. Se, então, você passar e me ver em cima do telhado, por favor, não me peça pra descer nem me ache um insensato: É que de lá eu vejo a vida passar com mais graça, e o lamento vira festa, e o pranto vira canto, e o choro, encanto. Lá de cima, no telhado...
sexta-feira, 30 de novembro de 2007
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
eu também quero um telhado desse!
um privilégio passar na vida e ter um canto assim. nem todo mundo o tem. bom mesmo é ter quando criança. melhor ainda conservá-lo até a idade adulta. que pena que andas embaixo... mas acontece! faz parte, né? não dá pra subir se não estivermos embaixo. o que me deixa feliz é tu perceber que tá precisando do telhado. demonstra sensibilidade e muitas outras coisas boas. torço por tua subida, beijo!
Postar um comentário